terça-feira, 2 de junho de 2009

UM POUCO DE NÓS ESTAVA TAMBÉM NO VOÔ AF 447

“E, como aos homens está ordenado morrerem uma só vez, vindo depois disso o juízo”. (Hebreus 9.27)

John Donne foi um pastor protestante no século XIX que dizia: “não importa por quem os sinos dobram (uma alusão ao repicar de sinos das igrejas católicas na Europa quando alguém falecia na cidade), eles dobram por mim e por você!”. Num tempo de consternação como esse que vivemos não encontro outras palavras para referir-se a tudo isso que vimos e participamos como: morremos um pouco mais! Nossa tecnologia que faz com que o homem transite na mesma órbita dos pássaros, não nos torna suficientemente protegidos das contingências da própria natureza que parece não se conformar com tamanha invasão de seu espaço vital.

Durante uma cerimônia de formatura, um pastor levantou-se e disse: “Vocês não pensam nisso agora, mas um dia vocês vão morrer. Quando forem colocados em seus túmulos, as pessoas vão se reunir ao redor citando os títulos que vocês conquistaram, ou falarão sobre o quanto vocês foram uma benção? As pessoas se lembrarão do quanto vocês foram ‘importantes’, ou lamentarão a perda do melhor amigo que tiveram? Os títulos são bons, mas se tiver de escolher entre um título e um testemunho, opte pelo testemunho! Faraó tinha o título, Moisés o testemunho. Nabucodonozor tinha o título, Daniel o testemunho. Jezabel tinha o título, Elias o testemunho. Pilatos tinha o título, mas Jesus o testemunho. É fácil pensar que ser alguém é o mais importante, mas são os atos de amor que você pratica que serão lembrados”.

Ainda estou com o coração partido pela queda do avião francês em território aéreo supostamente brasileiro ceifando a vida de mais de duas centenas de pessoas que, desfrutavam em sua maioria dos seus melhores anos. Dentre a tripulação havia príncipe brasileiro, um médico respeitado internacionalmente, um assessor político do prefeito da cidade do Rio de Janeiro, artistas, engenheiros, dentre outras pessoas “comuns” que iam à trabalho para a Europa ou ainda no desfrute de merecidas férias e comemorações festivas diversas!

Eles representavam muitos títulos, como os noticiários vêm alardeando desde ontem, mas eu quero me ater nesse artigo em seus testemunhos, suas histórias de vida e também preciso lançar uma reflexão sobre dois aspectos para mim muito taxativos sobre a morte: a necessidade de estarmos preparados para o encontro com ela e também no fato de que precisamos morrer sem perder a vida. E, a partir da história dessa tragédia aérea que nos tem deixado assustados vamos pensar sobre a brevidade da vida.

Ouvi histórias de quem estava nesse vôo que me marcaram: a do alemão que voltava a Europa para pegar alguns documentos para viabilizar seu casamento com uma brasileira, um trabalhador que iria exercer sua profissão em Angola prevendo um tempo melhor para a sua família, uma jovem que ao ouvir de sua mãe o quanto ela amava disse apenas: “amém, amém e amém”! Foram dados alguns abraços efusivos (como do que iria para a Angola) que geraram um e outro estranhamento, mas que em contextos de viagens sem volta sempre ficam a martelar a frágil consciência de quem fica e sofre dobrado! A morte de fato é inexplicável mas, algo que acontece em várias histórias é a impressão de que muitos estavam se despedindo, não era um “até breve”, mas um “adeus”!

Um pouco de nós estava naquele vôo, a natureza humana é muito volátil em suas sensações e eu temo que daqui a alguns dias todos se esquecerão dessa tragédia e continuarão suas vidas. Mas, algo precisa acontecer! Temos de nos impactar! Ontem até mesmo o irreverente programa de televisão “CQC” fez um tempo de silêncio em solidariedade ao acontecido! O próprio presidente Lula não participou de um almoço comemorativo em El Salvador, dizendo: “não há clima para se comemorar nada!”.
Temos de parar, refletir sobre a vida, e eu lanço aqui algumas reflexões:

(a) Temos de viver a vida de fato como quem se encontra de passagem nesta terra!

Era esse o pensamento do autor da carta aos Hebreus: “Porque não temos aqui cidade permanente, mas buscamos a vindoura” (13.14). Essa busca tem de ser séria na nossa curta existência aqui na terra. Não somos de fato donos de nada por aqui, somos peregrinos, estamos indo na direção da nossa verdadeira casa: a cidade celestial.

Não podemos nos dar ao luxo de nos encantarmos com as belezas desse mundo tão vil e cruel. Há belezas aqui, sim, mas elas não podem nos roubar da visão de que nada permanecerá de pé por toda a vida, tudo um dia cederá o lugar para o que de fato será permanente, a eternidade. No momento estamos presos a esse tempo cronológico, mas não persistiremos assim não, e o que me impacta é o fato de que aquelas pessoas que estavam no vôo pensavam que chegariam aos seus respectivos destinos, fizeram planos, elaboraram metas, mas o Senhor Deus resolveu recolher-nos no tempo que Ele determinou para cada um deles!

(b) A morte deixa-nos com uma sensação amarga na boca!

É sempre assim: quando sabemos de uma tragédia, um pouco de nós morre, fica como que desmaiado, sob o efeito do narcótico da dor. Logo pensamos nos nossos filhos, pais, amigos, irmãos, enfim, naqueles que amamos e pretendemos ainda marcar suas vidas com o nosso testemunho. É triste, mas ao mesmo tempo é realista pensar que um dia todos nós vamos experimentar o lado de dentro da morte! Hoje temos visão dela por fora, visitamos os funerais, choramos nos velórios dos outros, mas um dia estaremos vivendo o lado de dentro dessa questão emblemática, seremos nós os mortos! E ai? Como encararemos?

Quando lidamos de perto com a morte, lidamos com o que há de mais melindroso em nós, o temor de passar uma vida inteira e não conseguir influenciar nada para que esse mundo fosse um pouquinho melhor! Só pode se sentir completo quem cumpre bem a sua missão olhando para a sua volta e percebendo que o mundo ficou um pouco mais colorido graças a sua presença. Isso é sério! É quando morremos, mas não perdemos a vida! Parece estranho, mas é real. Alguns morrem sem perder a vida. E outros perdem a vida sem morrerem!

Jim Elliot, o missionário sacrificado com 29 anos pelos indígenas em sua tentativa de comunicação com uma tribo do Equador para a implantação de um trabalho missionário, disse em seu diário: “não é tolo aquele que dá o que não pode reter, para ganhar o que não pode perder!” Ele morreu, mas não perdeu a vida! Seu exemplo de vida, mesmo depois de morto encoraja milhares de missionários em todo o mundo! Sua abnegação não foi em vão! E a história confirma que a esposa e o filho de Jim Elliot fizeram uma obra incrível no Equador entre os mesmos índios que tiraram a sua vida!

Quer saber de outro exemplo bíblico que me fascina: Eliseu ao morrer, adoecido por uma séria enfermidade foi sepultado e o texto de I Reis 13.20-25 é lindo ao referir-se ao que aconteceu quando um homem foi enterrado na mesma cova que o profeta: “Logo que ele tocou os ossos de Eliseu, reviveu e se levantou sobre os seus pés”. Ainda morto, Eliseu não perde sua unção profética e Deus lhe concede a realização de um derradeiro milagre, nada menos do que uma ressuscitação! Que Deus fantástico!

Assim é morrer e não perder a vida! Mesmo morto sendo alvo de lembranças curadoras, e sendo canal de bênçãos pelo testemunho empenhado por toda uma vida de dedicação à vontade do Senhor. A morte mesmo com seu sabor amargo na boca sempre produzirá gosto de mel quando se trata de apenas uma pausa para o desfrute de uma eternidade inteira com o Senhor da Vida, o próprio Deus revelado na Bíblia e encarnado em Jesus Cristo, nosso Senhor e Salvador!