segunda-feira, 21 de abril de 2008

O BRASIL CHORA POR ISABELLA!

Todo o país acompanha atordoado os desdobramentos do crime que tem tirado o sono de muita gente. O assassinato frio e cruel de uma criança de 05 anos, que como suspeitos únicos estão o pai e a madrasta. Os dados periciais revelados a publico nesta sexta, dia 18 de abril são contundentes, daí o indiciamento do casal por homicídio qualificado, por motivo torpe, cruel e sem oferecimento de defesa por parte da vítima.

Até o aonde vai a insanidade humana? Essa pergunta não quer se calar, eu tenho pensado fortemente no fato de que não foi só a Isabella que foi atirada da janela naquela tarde fatídica de 29 de março, na realidade toda a sociedade brasileira precipitou-se em um grande vazio ético e humano, deflagrando uma grave crise de valores que passa a nossa estrutura familiar.

Alguém que deveria ajudar zelar, acompanhar com carinho, na realidade carregou no colo a criança já asfixiada pela esposa e a precipita pela janela na tentativa de criar um quadro de suicídio insano que só fazia sentido na mente perversa de Alexandre Nardoni. Morremos um pouco junto com a Isabella.

E sempre me recordo em situações de morte da bela poesia do pastor protestante do século XIX, John Donne, intitulada “por quem os sinos dobram”: “A morte de qualquer homem me diminui, porque eu sou parte da humanidade; e por isso, nunca procure saber por quem os sinos dobram, eles dobram por ti”. Esse verso me faz pensar na minha responsabilidade de, como parte dessa sociedade não me tornar indiferente ao sofrimento de meu próximo.

Vivemos em uma sociedade narcisista onde o prazer está sempre em primeiro plano. É uma miséria viver em uma sociedade que não chora mais pelos seus mortos. Apesar da minha aparente frustração com o gênero humano o que eu tenho assistido acerca do caso da menina Isabella estão enchendo meu coração de esperança.

É fácil vermos nos noticiários as multidões que tem se acotovelado nas imediações da casa dos Nardoni e também da delegacia onde os mesmos prestam depoimentos, e isso atesta a generosidade do povo brasileiro e o choque que os pais de família estão recebendo país a fora.

É tempo de fazermos uma opção pela vida. Temos de resolver de vez essa questão que parece não querer parar dentro de cada coração humano: a da violência dentro de casa. Tudo nos leva a crer que houve uma discussão doméstica e quem recebeu o ônus do desequilíbrio do pai e da madrasta foi a meiga Isabella. Há homens e mulheres que nunca poderiam ser pais ou mães, não tem preparo, não tem controle, são desequilibrados. Eu tremo diante de pais e mães que só sabem conjugar os verbos recheados de brutalidade animalesca!

No ano de 2005 eu fui um entusiasta da campanha pelo “SIM” à limitação do porte de armas em nosso pais. Até hoje estou convencido de que temos de desarmar os cidadãos, isto porque nunca foi em nosso pais “direito” de alguém possuir arma, uma vez que é sabido de todos que o porte de armas é “concessão do Estado” e não direito da população em geral. Mas, é bem verdade que temos de começar desarmando o coração dos nossos cidadãos.
Tudo leva a crer que a Isabella não foi morta pelo uso de alguma arma, ela padeceu pelas mãos de quem deveria receber aconchego e carinho. Mãos que matam! A menina foi levada pelo colo até a janela em meio à um rastro de sangue, num cortejo fúnebre antecipado com um desfecho só previsível pelos adoentados de mente: a precipitação de uma janela do 5º andar.

Tenho de concordar com Calvino que vai dizer o seguinte: “O intelecto do homem está de fato cegado, envolto em infinitos erros e sempre contrário à sabedoria de Deus; a vontade, má e cheia de afeições corruptas, odeia a justiça de Deus; e a força física, incapaz de boas obras, tende furiosamente à iniqüidade”.

Essa verdade assusta os naturalistas que insistem em acreditar no mito da bondade natural do ser humano. Na realidade, o pecado enfeou o homem na sua essência, e o tornou depravado até aos ossos. Nada é bom no ser humano, e quando presenciamos situações vis de violência isso na realidade reforça nosso descrédito em relação ao ser humano caído e degenerado pela sua própria iniqüidade.

O que nos resta a fazer é lamentarmos profundamente. Acompanharmos com sofreguidão os passos do processo dos Nardoni e nos sentirmos afligidos pela certeza de que nossas crianças não estão completamente seguras neste mundo e que, somente a graça de Deus pode nos resgatar desse estado de pessimismo e devassidão.

A contribuição que a Reforma Protestante deu na defesa da vida pode parecer paradoxal: primeiro ela afirmou a pecaminosidade no ser humano, dizendo entre outras coisas que ele é mau na sua essência, embora ainda não o seja como deveria ser, e também atestando que a graça de Deus revelada em Jesus pode fazer deste individuo que é capaz das mais cruéis barbaridades alguém que compartilha da vida do próprio Deus sendo seu representante na luta pela justiça.

Jesus disse em seu famoso sermão: “bem aventurados os que tem fome e sede de justiça, porque eles serão fartos” (Mateus 5.6) e Lutero tem uma interessante contribuição nesse assunto: “A realeza, o império, a autoridade, o professor, o estudante, o pai, a mãe, o senhor e a senhora, o peão e a doméstica-todos são máscaras, pessoas que Deus deseja que sejam tratadas com respeito e reconhecidas como criação sua. É preciso que existam nessa vida, mas ele não quer que se lhes confira caráter divino”.

Embora não sendo “deuses” cabe aos homens e mulheres de nosso tempo denominado HOJE, fazer valer a intenção de Deus em fazermos ecoar os gritos de “justiça” não apenas enquanto as emoções estão à flor da pele pela morte de Isabella, mas todos os dias. Pesquisas apontam que a cada 40 minutos uma criança é agredida em nosso país. Os números não mentem. Precisamos gritar e protestar de que mãos foram criadas por Deus para acariciar e colo para aconchegar, nunca para servirem de instrumentos de tortura e execução sumária. O Brasil chora por Isabella e chora por indignação e luto. Morremos um pouco junto com a menina cujo drama capturou o coração de toda uma nação.

Ezequias Amancio Marins, presidente da Missão Angrense Reformada, diretor do Seminário Interdenominacional em Angra dos Reis e pastor da Igreja Batista Central em Japuiba.